segunda-feira, 19 de setembro de 2011

sábado, 17 de setembro de 2011

Ler não tem preço!

Ouvindo a bela entrevista de Marilza Conceição, nossa coordenadora regional da AEILIJ Paraná, para o e-amanhã do canal on-line do Governo do Estado do Paraná, ouvi a apresentadora dizer que livro no Brasil é caro. Não concordo. Livro tem uma vida estimada em 15, 20 anos. Perpassa mãos leitoras e leitores incontáveis. Como não gosto de calar e com a literatura desenvolvi meu senso crítico, abaixo discorro alguns poucos motivos que me levam a afirmar que o problema não é o preço do livro. O formato da nota é no formato da mensagem que enviei aos aeilijianos, associados da entidade de escritores e ilustradores que represento, a AEILIJ, em resposta ao vídeo que está aqui http://www.video.pr.gov.br/index.php?video=1629. Seria interessante ouvir a entrevista para em seguida prosseguir a leitura desta nota/mensagem.

Lanches de marcas famosas, fast foods - como o próprio nome diz - são consumidos uma vez por mês por inúmeras crianças brasileiras, entram pela boca, saem três horas depois por outro local e ainda saem cheirando mal e custam bem mais caros se pensarmos neste "custo benefício". Em minha casa, por exemplo, não entra coca-cola (que meus sobrinhos - com exceção de um -, pai, mãe e irmãos adoram) que faz um mal enorme à saúde. Com o dinheiro a ser investido neste veneno vou juntando as moedas e posso comprar um bom livro para eles, inclusive. Não tomo refrigerante há 25 anos. Com essa grana economizada povoei a estante com livros e quando um familiar vem me visitar e pede coca-cola eu abro a estante e despejo livros no tapete. Ao lado coloco um copinho de suco natural ou um copo com boa água. Para pai e mãe ofereço chá. E ponho-me a fazer a mediação da leitura.  

Esses lanches e outros desejos de consumo que nos plantaram via marketing nada mudam em sujeito algum, ao contrário do livro que entra pelos olhos, pela boca, pelo nariz, na pele, e pelo cérebro onde encontram, por vezes, uma porta secreta pro coração do leitor. Acho que esse preço é bem barato frente a tudo que um livro faz de diferenças na vida de quem lê. Dilua-se o valor de capa pelo estimado tempo de vida de um livro e pode-se perceber que ele custa barato, bem barato. O que ocorre é que, ainda em nossa sociedade o livro não tem a mídia necessária e o marketing dedicado a fazer dele um alimento essencial. Se o brasileiro não consegue comprar livro, como ele conseguiu comprar celulares e outros apetrechos tecnológicos para todos os membros da família? 

O fato é que livro não é da cultura do brasileiro por que não diz-se, não replicamos aos quatro ventos, que livro é prazer. As mídias todas estão a falar sobre livro ser caro. Pronto! Estão a criar um enorme problema, uma fronteira. Se muita gente estava a caminho de se tornar leitor vai passar a pensar melhor antes de ir ao encontro dos livros. Diz-se que livro serve para aprender. Prefiro dizer que livro serve para desprender. Soltar-nos de tudo que convencionou-se dizer sobre ele servir para ensinar. Não leio livros para aprender. Leio-os para me soltar, me sentir livre, me emocionar e perceber o quanto sou humano por que nos livros existem pessoas parecidas comigo, que viveram situações semelhantes. Isso me conforta como leitor. Com estas experiências vividas atravees da literatura eu me salvo por que as minhas dores e alegrias se humanizam ao encontrarem eco. Tento mostrar isto a cada pessoa com quem convivo. A mudança começa em casa e com os amigos, a quem sempre dou um livro que vi, li e gostei muito. 

Fala-se em livro popular. Ótimo, vamos facilitar o acesso. Quem um dia acostuma-se com algo mais barato outro dia vai desejar o outro mais caro. Ou nunca mais vai desejar nenhum outro, haja visto alguns livros baratos nos distanciam da qualidade. Já temos tantos livros populares! Recontos de tudo a preços módicos. Adaptações simplificadas a R$1,99. Se o brasileiro não os compra é por que livro não é sua prioridade. Ele não cresceu com esta fome. Não lhe estimularam a sentir esta fome. Uma questão mais cultural do que financeira. Meu sobrinho pede que eu lhe compre um determinado lanche e eu vou conversando com ele sobre livros a caminho da lancheria e depois, estrategicamente desvio o caminho para dar uma 'passada' na livraria. Mostro a ele um ou outro livro que custe por volta do mesmo preço do que viríamos a gastar com o lanche. Depois me aproximo de outro, mais caro, de acabamento melhor. Se escrito ou ilustrado por um amigo do titio, melhor ainda, abro-o, mostro suas ilustracões, falo a respeito do autor, comento o traço, a paleta de cores, leio suavemente um pequeno trecho das palavras, deixo-o com água na boca e nos olhos. Se ele desejar o livro negocio o câmbio de uma coisa por outra. Se ele aceitar, ganha ele ao ganhar um livro. Ganho eu como mediador. E depois, claro, eu até invento um lanche mais simples, artesanal e rico em proteínas em casa para matar sua outra fome enquanto folheamos o presente alimento futuro. Forma-se leitores não somente dando livros, mas despertando no presenteado o desejo de nutrir a fome de lê-los.

Como autor não posso concordar que livro é caro. Livro é investimento. Essa prática, inclusive de reafirmar que livro é caro, distancia o possível leitor do objeto de arte e da possibilidade de renovação que propicia um livro a seu leitor. Distancia o leitor de nutrir esta fome. Torna o livro, cada vez mais, algo indesejado e inalcansável. Torna-o secundário, sempre, na vida de qualquer pessoa, como se ler não nos fosse vital.

Hermes Bernardi Jr.
Escritor e Ilustrador de LIJ

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Minha voz não quer calar

Havia algum tempo eu pensava em reativar o Projeto Terça eu conto pra você, que consistia em saídas para entidades assistenciais a fim de oportunizar leituras a quem estivesse afastado dela por N motivos.

Pois bem, pensei, ouvi Sônia Zanchetta - que me passou uma pesquisa sobre a leitura no Brasil, realizada pelo MinC e que apresentava dados dolorosos de leitores funcionais acima dos quarenta anos, li e reli os livros de Michèlle Petit e de alguns sociólogos, atntei para as excelentes iniciativas que integram o corpo diagnóstico do PMLL- Plano Municipal do Livro e Leitura de Porto Alegre e recolhidas pelo GT (Grupo de Trabalho) do qual faço parte muy honrosamente como representante da AEILIJ - Associação Nacional dos Escritores e Ilustradores de Literatura Infantile Juvenil da qual, aliás, sou o atual presidente.

Esboçava criar um projeto e ir à luta em busca de recursos, mas confesso que estou cansado de correr atrás de dinheiro para realizar as boas intenções. Com tanto dinheiro indo para dentro de cuecas e outras peças de vestuário sinto dizer que cansei de balela. Também pensei que, se queremos realizar, basta começar. Junto a isso, cansava-me o facebook. Imaginava que a ferramenta, além da exposição das vaidades humanas, além de nos aproximar de gente querida e interessante ao ofício, ao intercâmbio, poderia ser uma boa via para disseminar um vírus. Um vírus do bem, claro. O vírus da leitura, que cultivo frente às adversidades que se justapõem em nosso caminho ansioso por bondade.

A partir de uma experiência realizada junto ao corpo de bailarinos da Cia. de Dança de Caxias, para a qual prestei algum serviço ao novo espetáculo, pus-me a ler um livro aos bailarinos em pleno ensaio,  como prática de incentivo à criação de imagens e coreografias para o trabalho que se insinuava. Já fui ator, dramaturgo premiado, já contei histórias dramatizadas, em dia de chuva já atolei no barro carregando livros dentro de uma caixa para que eles chegassem ao seu destino: os leitores da zona rural, lá em Santiago/RS, cidade onde passei parte de minha infância e parte da minha juventude, e onde criei meu primeiro projeto de incentivo à leitura chamado hora do conto, nos idos de 1989, ao ver que a biblioteca da Cidade vivia vazia sendo que havia tantos mundos a serem explorados se proporcionássemos aos livros o prazer de serem abertos.

Na capital e em algumas cidades do interior, fui para áreas públicas com uma equipe super qualificada - a vereadora e atual presidente da Frente Parlamentar do Livro e Leitura da Câmara de Vereadores, inclusive - levar os leitores a voarem no Tapete Mágico/Espaço de Leituras, inicialmente financiado pelo Fumproarte. Percorri inúmeras cidades brasileiras, e até na Espanha, sempre dando um jeito de ler para outros com tamanho prazer que não cabe nestas palavras. Quando a gente quer, a gente consegue, mesmo que muitos ao redor não queiram que a gente o faça, ou que a gente queira. Por isso, muitas vezes, quando senti meu desejo de continuar lendo e promovendo leituras ameaçado, excluí-me de certos círculos ditos sociais. Proteji meu bem maior: a vontade, única e inabalável de possibilitar a outros o mesmo prazer que eu sempre tivera ao ler um bom livro.

Depois de tanto, parei um pouco. Depois de tanto, dediquei-me a escrever e ilustrar para crianças. Já são dezessete livros publicados em diversas editoras brasileiras, e outros tantos a caminho. Meu filhos de meu casamento com a Literatura. Amada e honrosa esposa.

Quase cansei. Dei parte dos meus dias, e continuo dando, aos associados da AEILIJ, criando alternativas e situações junto a poucos e heróicos diretores que trabalham incansavelmente para que a boa LIJ seja debatida e espalhada pelos ventos brasileiros. E ainda assim, há quem diga que eu trabalhe para mim. Exclusivamente para mim. Há quem queria destruir o construído, mas como bem escreveu e fez exercício pleno por toda a sua vida a escultora Louise Burgeois ensinou-me que é preciso destruir para reconstruir. O que na Psicologia chamam de relisilência. Ou, como já escreveu Saint Exupèry "é preciso que eu suporte duas ou três lagartas se eu quiser conhecer as borboletas". Sábio Exupèry, com quem descobri que o mundo é para ser descoberto em cada pequeno planeta que nos circunda, e com quem também aprendi a liberdade de escolher habitá-los ou não. Essa é a minha maior verdade e a minha mais verdadeira escolha. Minha liberdade. Liberdade esta que a Literatura me deu e tem dado e da qual não pretendo me desfazer até que meu corpo deixe de ser morada para este ocupante bondoso.

Por isto, hoje, depois de ler em situações distintas sete vezes o livro Seda, de Alessandro Baricco - e que me foi gentilemente recomendado pela amiga Luciana Savaget - depois de lê-lo para sete distintas e seletas plateias - leia-se seletas como quem lê simples, humilde, desfavorecida de amplo conhecimento, que anunciar-lhes algo.

Feito o desabafo deste que dedicou mais de 30 anos, e ainda se dedica, ao livro e à leitura, incondicionalmente, não como uma forma de sobrevivência de equivocadas escolhas, mas para sobrevivência da própria leitura, - haja visto eu não tenha tempo sequer de fazer o que as pessoas comuns fazem, como namorar, ir à praia nos feriados, sentar em frente à TV para assistir novelas - Odeio! ou pensar em erigir palácios para amenizar a dor da autoclausura, ou ainda delimitar fronteira,  antítese de segurança - quero contar a você, querido e paciente leitor ouvinte, sobre meu novo projeto: Lendo em sua Casa.

Quero ler para pequenas plateias, familias, amigos, vizinhos; ao redor da mesa, perto do fogo, ao sol, sob a sombra de uma árvore, em sua casa. Me chame que eu vou! Ou, venha me buscar, se quiser fazer uma pequena gentileza a este leitor de salas, cozinhas e pátios. Vou à sua casa e ponho em prática a prática de leitura sem custos e a qual aprendi a amar como amo a vida pousada nas palavras e imagens que os livros acomodam tão generosamente. Ler é prazer! Que o seja junto aos amigos que conheço e aos que pretendo conhecer através da literatura. Você, talvez!

Ah! Não tenho carro por opção, por isto fico feliz se me levam e me trazem de volta, são e mais salvo do que nunca depois de espalhar as boas palavras como fazem os zen-budistas ao suspenderem bandeiras de boas orações para que o vento as espalhe por todo o lugar onde sopre. Eu o tenho feito aos meus afetos e desafetos. Desejo do fundo do meu coração que cumpram seus destinos.

Como retribuição, ou presente ao seu convite e hospitalidade, escolho o livro a ser lido. Minha surpresa aos leitores, meu carinho aos ouvintes. Posso garantir uma boa escolha, pois tenho lido muito nestes anos todos, não para me sobrepor ao outro, mas para andar junto a ele, o mais simples, o mais honesto, o mais humilde possível, no centro de sua paz: a casa.


Desculpem-me, não atendo escolas com esta iniciativa. Como eu disse, quero fazer entrar a leitura no coração do seu lar.

Contem comigo! Eu conto pra vocês!