quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Minha voz não quer calar

Havia algum tempo eu pensava em reativar o Projeto Terça eu conto pra você, que consistia em saídas para entidades assistenciais a fim de oportunizar leituras a quem estivesse afastado dela por N motivos.

Pois bem, pensei, ouvi Sônia Zanchetta - que me passou uma pesquisa sobre a leitura no Brasil, realizada pelo MinC e que apresentava dados dolorosos de leitores funcionais acima dos quarenta anos, li e reli os livros de Michèlle Petit e de alguns sociólogos, atntei para as excelentes iniciativas que integram o corpo diagnóstico do PMLL- Plano Municipal do Livro e Leitura de Porto Alegre e recolhidas pelo GT (Grupo de Trabalho) do qual faço parte muy honrosamente como representante da AEILIJ - Associação Nacional dos Escritores e Ilustradores de Literatura Infantile Juvenil da qual, aliás, sou o atual presidente.

Esboçava criar um projeto e ir à luta em busca de recursos, mas confesso que estou cansado de correr atrás de dinheiro para realizar as boas intenções. Com tanto dinheiro indo para dentro de cuecas e outras peças de vestuário sinto dizer que cansei de balela. Também pensei que, se queremos realizar, basta começar. Junto a isso, cansava-me o facebook. Imaginava que a ferramenta, além da exposição das vaidades humanas, além de nos aproximar de gente querida e interessante ao ofício, ao intercâmbio, poderia ser uma boa via para disseminar um vírus. Um vírus do bem, claro. O vírus da leitura, que cultivo frente às adversidades que se justapõem em nosso caminho ansioso por bondade.

A partir de uma experiência realizada junto ao corpo de bailarinos da Cia. de Dança de Caxias, para a qual prestei algum serviço ao novo espetáculo, pus-me a ler um livro aos bailarinos em pleno ensaio,  como prática de incentivo à criação de imagens e coreografias para o trabalho que se insinuava. Já fui ator, dramaturgo premiado, já contei histórias dramatizadas, em dia de chuva já atolei no barro carregando livros dentro de uma caixa para que eles chegassem ao seu destino: os leitores da zona rural, lá em Santiago/RS, cidade onde passei parte de minha infância e parte da minha juventude, e onde criei meu primeiro projeto de incentivo à leitura chamado hora do conto, nos idos de 1989, ao ver que a biblioteca da Cidade vivia vazia sendo que havia tantos mundos a serem explorados se proporcionássemos aos livros o prazer de serem abertos.

Na capital e em algumas cidades do interior, fui para áreas públicas com uma equipe super qualificada - a vereadora e atual presidente da Frente Parlamentar do Livro e Leitura da Câmara de Vereadores, inclusive - levar os leitores a voarem no Tapete Mágico/Espaço de Leituras, inicialmente financiado pelo Fumproarte. Percorri inúmeras cidades brasileiras, e até na Espanha, sempre dando um jeito de ler para outros com tamanho prazer que não cabe nestas palavras. Quando a gente quer, a gente consegue, mesmo que muitos ao redor não queiram que a gente o faça, ou que a gente queira. Por isso, muitas vezes, quando senti meu desejo de continuar lendo e promovendo leituras ameaçado, excluí-me de certos círculos ditos sociais. Proteji meu bem maior: a vontade, única e inabalável de possibilitar a outros o mesmo prazer que eu sempre tivera ao ler um bom livro.

Depois de tanto, parei um pouco. Depois de tanto, dediquei-me a escrever e ilustrar para crianças. Já são dezessete livros publicados em diversas editoras brasileiras, e outros tantos a caminho. Meu filhos de meu casamento com a Literatura. Amada e honrosa esposa.

Quase cansei. Dei parte dos meus dias, e continuo dando, aos associados da AEILIJ, criando alternativas e situações junto a poucos e heróicos diretores que trabalham incansavelmente para que a boa LIJ seja debatida e espalhada pelos ventos brasileiros. E ainda assim, há quem diga que eu trabalhe para mim. Exclusivamente para mim. Há quem queria destruir o construído, mas como bem escreveu e fez exercício pleno por toda a sua vida a escultora Louise Burgeois ensinou-me que é preciso destruir para reconstruir. O que na Psicologia chamam de relisilência. Ou, como já escreveu Saint Exupèry "é preciso que eu suporte duas ou três lagartas se eu quiser conhecer as borboletas". Sábio Exupèry, com quem descobri que o mundo é para ser descoberto em cada pequeno planeta que nos circunda, e com quem também aprendi a liberdade de escolher habitá-los ou não. Essa é a minha maior verdade e a minha mais verdadeira escolha. Minha liberdade. Liberdade esta que a Literatura me deu e tem dado e da qual não pretendo me desfazer até que meu corpo deixe de ser morada para este ocupante bondoso.

Por isto, hoje, depois de ler em situações distintas sete vezes o livro Seda, de Alessandro Baricco - e que me foi gentilemente recomendado pela amiga Luciana Savaget - depois de lê-lo para sete distintas e seletas plateias - leia-se seletas como quem lê simples, humilde, desfavorecida de amplo conhecimento, que anunciar-lhes algo.

Feito o desabafo deste que dedicou mais de 30 anos, e ainda se dedica, ao livro e à leitura, incondicionalmente, não como uma forma de sobrevivência de equivocadas escolhas, mas para sobrevivência da própria leitura, - haja visto eu não tenha tempo sequer de fazer o que as pessoas comuns fazem, como namorar, ir à praia nos feriados, sentar em frente à TV para assistir novelas - Odeio! ou pensar em erigir palácios para amenizar a dor da autoclausura, ou ainda delimitar fronteira,  antítese de segurança - quero contar a você, querido e paciente leitor ouvinte, sobre meu novo projeto: Lendo em sua Casa.

Quero ler para pequenas plateias, familias, amigos, vizinhos; ao redor da mesa, perto do fogo, ao sol, sob a sombra de uma árvore, em sua casa. Me chame que eu vou! Ou, venha me buscar, se quiser fazer uma pequena gentileza a este leitor de salas, cozinhas e pátios. Vou à sua casa e ponho em prática a prática de leitura sem custos e a qual aprendi a amar como amo a vida pousada nas palavras e imagens que os livros acomodam tão generosamente. Ler é prazer! Que o seja junto aos amigos que conheço e aos que pretendo conhecer através da literatura. Você, talvez!

Ah! Não tenho carro por opção, por isto fico feliz se me levam e me trazem de volta, são e mais salvo do que nunca depois de espalhar as boas palavras como fazem os zen-budistas ao suspenderem bandeiras de boas orações para que o vento as espalhe por todo o lugar onde sopre. Eu o tenho feito aos meus afetos e desafetos. Desejo do fundo do meu coração que cumpram seus destinos.

Como retribuição, ou presente ao seu convite e hospitalidade, escolho o livro a ser lido. Minha surpresa aos leitores, meu carinho aos ouvintes. Posso garantir uma boa escolha, pois tenho lido muito nestes anos todos, não para me sobrepor ao outro, mas para andar junto a ele, o mais simples, o mais honesto, o mais humilde possível, no centro de sua paz: a casa.


Desculpem-me, não atendo escolas com esta iniciativa. Como eu disse, quero fazer entrar a leitura no coração do seu lar.

Contem comigo! Eu conto pra vocês! 

Um comentário:

Tino Freitas disse...

Querido Hermes. Compartilho muito do que dizes aqui. A paixão, a indignação e a paixão em levar a leitura a outros. Que o sorriso esteja sempre presente em seu coração.